quinta-feira, 18 de outubro de 2012

''Aqui jaz um coração. Um coração surrado, maltratado, sofrido. Um coração que muitas vezes esteve no ápice da sua dor e que, por pouco, quase parou. Aqui jaz o sofrimento e todas as coisas ruins que esse coração carrega. Olheiras profundas, olhos pesados, lágrimas ácidas. Algemas presas à solidão. O lado mais sombrio e solitário que se pode ter dentro de si. Tudo, absolutamente tudo, será enterrado de uma vez por todas aqui. E o tudo inclui você. Melhor dizendo, o tudo costumava ser você. Você e todas aquelas coisas - qualidades, defeitos, manias - que te transformavam no melhor ser humano do mundo. Você e toda aquela sua lábia errada que te fazia ser alguém essencial na minha vida. Aqui jaz esse alguém. O alguém que eu pensei que realizaria todos os meus planos no futuro e seria todos os meus sonhos no presente. O alguém que fez com que eu derrubasse os muros que isolavam o meu mundo dos demais apenas pra vê-lo sorrir, não me importando se isso me fizesse chorar. Aqui jaz lágrimas. Lágrimas que foram derrubas em vão diversas vezes por erros e culpas que não foram minhas. Lágrimas que mais pareciam uma enxurrada de dor acumulada no peito. E você era o motivo por todo esse acumulo. Aqui jaz uma boa filha, boa amiga, boa neta, boa sobrinha e boa namorada: eu. Uma menina que se viu mulher da noite pro dia e, na noite seguinte, voltou a ser apenas uma menina. Frágil, boba, inocente, perdida, burra, usada. Tudo de bom e de bonito que eu tinha por dentro de toda essa pele e carne e ossos e veias, enfim, você me roubou. Você levou de mim tudo o que, de fato, era meu. Assim como quem assalta bolsas, carteiras ou celulares, você assaltou a minha confiança, a minha auto estima e a minha vontade de viver. Aqui jaz a minha vida e tudo o que eu era antes de você ter entrado nela. O canto dos pássaros, o brilho das estrelas, o barulho das ondas quebrando no mar, o choro da criança desapontada, o riso do velhinho sentado no banco da praça, o cheiro do pão saindo do forno… Tudo acaba de morrer. Virou cinzas. Agora me vejo repleta de cicatrizes internas. Qualquer coisa que passa por mim não me atravessa mais. E mesmo que soe ridículo, parece ser mais doloroso não sentir nada à sentir as decepções do mundo inteiro. Nenhum sentimento, pra melhor ou pra pior, eu sou capaz de sentir novamente. O vazio, o oco e o opaco tomaram conta das minhas entranhas de felicidade e formaram abismos por onde quer que eu passe. O quente do conto de fadas se derreteu e sobrou apenas a parte mais gélida do conto - desta vez, sem fadas. Aqui jaz um amor. Um amor capaz de superar todos os outros amores existentes, apenas pelo fato de ter tomado conta de mim. Um amor com alma de criança levada e coração de gente adulta. Aquele amor que cega os olhos e ensurdece os ouvidos. Eu o tive. Ou melhor, ele me teve. Como um fantoche que se controla, eu me senti incapaz de lutar contra algo que estava dentro de mim. Me rendi, sei bem. Me entreguei de peito aberto, mergulhei de ponta cabeça, andei nas pontas do dedos e depositei toda a minha confiança em um par de olhos castanho-esverdeados. Agora estou pagando por isso. É mais seguro ter alguma carta escondida embaixo do braço, eu sei, o problema é que quando se ama, também não se pensa. Acabei apostando tudo, sem me dar conta do tamanho da imaturidade que estava fazendo. E tudo o que eu fui, tudo o que eu era ou tudo o que eu pensava ser foi pro ralo. Agora, estou tendo a chance de recomeçar do zero, com novos objetivos, motivos e princípios de vida. O mundo acaba de nascer outra vez pra mim e, principalmente, eu acabo de nascer outra vez pro mundo. Aqui jaz um passado que não merece ser lembrado.''

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